Novas restrições à arte de rua que se mantenha viva no Porto
- Nádia Neto

- 18 de dez. de 2023
- 4 min de leitura
Atualizado: 16 de jan. de 2024
Na cidade do Porto, o cenário artístico está prestes a mudar. Os artistas de rua vão ter de pagar licenças para atuar no espaço público, com horários e espaços mais restritos, há ainda zonas da cidade interditas. Em causa está o regulamento proposto pela Câmara Municipal que obriga os animadores de rua a pagar uma taxa de ocupação.
Ao descer a Rua de Santa Catarina no Porto, junto ao Shopping via Catarina está Galdino, um artista de rua nato. O brasileiro, de 43 anos, residente em Portugal há 12 anos, viu na rua uma oportunidade para demonstrar o que vale, através da música.

“Eu vim a Portugal numa turnê de música de lusofonia por 10 países de língua portuguesa, começa por contar. “10 músicos de língua portuguesa que rodaram por 10 países de língua portuguesa e o último era Portugal e eu fiquei. No último show disse à minha mãe: “vou ficar”, explica.
Entre as 10h e 22h, o artista está sempre na calçada da rua, muito concentrado. De sorriso fácil e guitarra na mão – que tem coladas moedas de todos os países - , um microfone e um amplificador, toca e interpreta música do nordeste brasileiro. Ney Matogrosso é uma das suas referências.
O músico adota um estilo próprio, com vários adereços e maquilhagem verde: “É coisa do teatro. Eu gosto de cor de pavão. Eu sou meio pavão.”
Atuar na rua surgiu naturalmente na vida do músico, há 20 anos. Além de tocar na rua, atua no Café Lusitano, na Casa dos Livros, no Stage 79 e ao redor das galerias de Paris, no Porto.
Como todos os artistas, durante o seu espetáculo, faz pequenas pausas na pastelaria em frente - “Fábrica da Nata”. Como já é cliente habitual, o estabelecimento deixa o artista utilizar uma da cadeira da esplanada para colocar o amplificador, uma vez que a esplanada enche de público, quando ele toca.
O artista acredita que o pior de ser artista de rua é o desprezo da sociedade, afirma que “90 % das pessoas” desvalorizam o seu trabalho.
Para o artista, não é principalmente pelo dinheiro que pratica o seu ofício: “Eu no meu caso estou dando amor para todo o mundo, estou abençoando todo o mundo”. Mas criou os três filhos (de 18, 20, 22 anos), que também são músicos, com as moedas que consegue na rua. Um dos filhos toca com Galdino na rua.
Há momentos que jamais cairão no esquecimento de Galdino. É comum testemunhar pessoas a chorar com as suas músicas. Já ouviu pessoas do público a dizer: “Você me salvou”, em situações de suicídios e de fim de relações.
Vê o espaço urbano como uma sala de espetáculos. Nesta rua, há todos os dias quatro artistas que se respeitam e até combinam horários: Cada um toca uma hora. Se chegar alguém vai esperar”.
Em relação à proibição para atuar sem licença, revela que: “Sempre foi proibido e há 20 anos que eu faço proibido. Agora vai sair no diário e eu vou continuar. Se tiver que ir preso todos os dias (…). Já fui tantas vezes preso (…)”.
“A câmara quer tirar a liberdade, impor horários e locais. Quer dizer, eu hoje toco aqui, amanhã tenho de tocar no meio da Praça do Marquês, onde não há público”, diz Galdino, relativamente à proposta da autarquia. “Não pode ser assim. Aliás, a escolha de tocar na rua é a liberdade de expressão”, acrescenta.

Já Miguel, o Estátua Viva, quando questionado acerca das novas restrições à arte de rua, confessa que: “Desde que possamos continuar a trazer alegria, estou aberto a ajustes. A arte deve estar ao alcance de todos”.
Contudo, apesar de acreditar que é a liberdade o mais aliciante na arte urbana, “O Estátua Viva” também acredita, tal como Galdino, que “espalhar alegria e conectar-se com as pessoas de uma maneira única” é o que o move para ir diariamente para as ruas.
O artista admite ter mais quatro fatos de estátua, feitos pelo próprio, que misturam “encanto, surpresa e um toque humor”. Neste dia, tinha vestido um fato azul com um peixe como objeto de adereço, em homenagem ao “oceano de oportunidade artísticas”, explica.
Ainda no coração da cidade, uma multidão assiste a um espetáculo de dança de Olímpio e Júlia, são parceiros de dança e de matrimónio. O casal pretende abrir uma escola de dança de salão com o dinheiro que juntam das atuações de rua, ao fim de semana.
Estes artistas que partilham o mesmo palco e as mesmas dificuldades. Procuram na calçada a possibilidade de criar carreira no mundo da música. Porém, vão passar a ter de ter autorização e pagar licenças para usar as ruas do centro histórico como palcos e ponderam fazer um abaixo-assinado para mostrar que fazem falta à cidade e aos comerciantes.
As novas regras vão abranger atividades relacionadas com canto, música, dança, estátuas ao vivo, magia, mímica, marionetas e artes circenses.
A Câmara justifica a medida como forma de reforçar a rotatividade dos artistas, especialmente em locais de elevada afluência turística. Contudo, a medida está a causar polémica e em discussão desde julho.
Nas zonas mais movimentadas e turísticas, será cobrada uma taxa de ocupação, fixada entre um e dois euros por dia. As atuações só serão permitidas entre as 8h e 22h, sendo que entre as 20h e as 22h só serão permitidas as que não usem qualquer tipo de som. Cada artista terá um espaço máximo de 2,5 metros. Além disso, os artistas não podem estar a menos de 250 metros uns dos outros na mesma rua.
Certas áreas, como a Avenida dos Aliados, a Praça do General Humberto Delgado, a Praça de D. João I, o Largo Amor de Perdição (Cordoaria) e o passeio em frente ao Jardim do Palácio de Cristal, estão proibidas para atuações de rua.





























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