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[Crónica] Ser Neta de Abril

  • Foto do escritor: Nádia Neto
    Nádia Neto
  • 10 de jan. de 2024
  • 2 min de leitura

Atualizado: 17 de jan. de 2024

As tardes de domingo são reservadas para visitar os avós. Sentada no sofá da sala, folheio um álbum de fotografias antigas. Entre retratos envelhecidos e sorrisos congelados no tempo, naquelas páginas amarelas, vejo a história que antecedeu uma neta de abril.

 

O 25 de abril de 1974, não é apenas uma data nos livros de história, faz parte da identidade de qualquer português. Os relatos destes tempos, da repressões e luta pela liberdade ecoam nas conversas à volta da mesa, misturando risadas, conselhos e olhares profundos. Cada ruga no rosto do meu avô conta uma história e nem sempre me deixa olhar para ela duas vezes, apesar das minhas insistências.

 

O meu avô fala-me do seu jardim, das flores que semeia todas as primaveras e quando no verão desabrocham oferece à minha avó, das horas que passa a regar aquele pedaço de terra.

 

Fecho o álbum de fotografias e regresso ao presente, trago comigo não apenas memórias e apercebo-me que aquele jardim requer um cuidado constante, que não sei se vou conseguir cuidar quando ele partir. Deixar não morrer as flores ou não me esquecer de regar são tarefas difíceis para quem nunca experimentou a arte da jardinagem. Não deixar murchar a história daquele belo jardim, como nunca vi igual, não é para todos. E quando chegar o inverno ou uma tempestade o que é suposto fazer? A complexidade da tarefa à minha frente é evidente.

 

Ser neta de abril é saber que cuidar do jardim dos avós não é uma tarefa fácil, é encontrar tesouros em todos os armários da avó, é ver a avó a receber flores, é lidar com os silêncios profundos à mesa do avô quando se fala da decadência da democracia, mas também é perceber que tenho o regador e as luvas do meu avô para construir o meu próprio jardim.




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